Disfagia em idosos: tratar as complicações e resgatar o prazer de comer

Tratar paciente com disfagia é um desafio nutricional e clínico que envolve várias etapas e acompanhamento e cuidados de uma equipe multidisciplinar, que inclui médico, nutricionista e fonoaudiólogo

 

A disfagia não é uma doença, mas um sintoma, uma sequela representado por qualquer dificuldade para engolir alimento ou saliva, geralmente com engasgos, sensação de “bolo" ou alimento parado na garganta, recusa alimentar com algumas consistências, geralmente sólidos ou líquidos, regurgitação, tosse “úmida”, além de sialorreia (excesso de saliva) ou diminuição de salivação.

É uma disfunção que atinge principalmente os idosos, devido ao envelhecimento das estruturas que fazem parte da deglutição, denominada presbifagia, decorrentes da fraqueza muscular, degeneração do sistema nervoso, além da diminuição de salivação, principalmente naqueles que apresentam depressão ou ansiedade e necessitam de algumas medicações que reduzem a salivação, como alguns antidepressivos, por exemplo.

 

Resgatar o prazer de comer

A alimentação tem uma importância fundamental no tratamento da disfagia, não só para o paciente, mas para a família, impactando muito na saúde e no emocional do paciente e no ambiente familiar. A dieta deve levar em consideração a história clínica do paciente, suas preferências alimentares, seu estado nutricional e o tipo e o grau de disfagia, que interferem diretamente na consistência das preparações.

Nutrição e fonoaudiologia precisam trabalhar juntos para determinar a consistência, o volume e o modo de como será ofertado o alimento (colher, copo, canudo, etc), assim como os cuidados de como cada preparação será estabelecida. 

Manter preparações atrativas, saborosas e adaptar às preferencias alimentares do idoso e do seu ciclo familiar dentro da prescrição nutricional e da consistência definida como segura, é o principal desafio para os nutricionistas conforme explica a nutricionista Alice Mesquita, especialista em gerontologia e nutrição enteral e parenteral. “Nosso trabalho vai muito além da manutenção ou recuperação do estado nutricional e aporte adequado dos nutrientes. O objetivo é auxiliar no resgate de um dos maiores prazeres do ser humano que é o ato de “comer”, um ato biopsicossocial, ou seja, comemos para nutrir o corpo, mas também para alimentar nossas emoções e relacionamentos sociais”, explica.

A fonoaudióloga hospitalar Gabriela Lima de Oliveira, atuante em assistência ao idoso com disfagia e distúrbios de deglutição e disfagia oncológica, esclarece que a relação familiar é um aspecto fundamental no tratamento. “A dificuldade do idoso em se alimentar impacta muito na vida da família, em todos os aspectos. Ver o idoso com essa dificuldade traz um sentimento muito forte de fragilidade, de descontinuidade da vida. E poder contar com essa assistência é fundamental para as famílias, que já entendem o quanto é importante essa compreensão multidisciplinar para o sucesso do tratamento”, esclarece.

 

O papel da fonoaudiologia

Na disfagia, o fonoaudiólogo trabalha com a equipe multidisciplinar no diagnóstico da gravidade, tratando a falha muscular e sensorial da função de deglutição coordenada com a respiração, definindo o melhor momento para o idoso ser alimentado, em qual consistência (sólida macia, pastosa, líquida ou multiconsistências), de que forma, e qual utensilio será utilizado. Para isso, a fonoaudiologia conta com o suporte de importantes tecnologias para a reabilitação da deglutição, como eletroterapia, laserterapia, ultrassom terapêutico, aplicação de Knesio Tape e uma variedade de outras técnicas.

 

 

Complicações da disfagia

A principal complicação da disfagia é a pneumonia por aspiração de saliva ou alimentos, podendo ocorrer também bronquiectasias e fibrose pulmonar causadas por aspiração crônica. Além disso, a diminuição da ingesta alimentar pode causar desnutrição, desidratação e perda ponderal.

Quanto à prevenção, a médica otorrinolaringologista Natasha Andrade Braga, especialista em disfagia e coordenadora do Serviço de Laringologia e Disfagia da residência médica de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Professor Edgard Santos, da Universidade Federal da Bahia (HUPES/UFBA), explica que quando a disfagia é sintoma de uma neuropatia, não há como prevenir. “Contudo, é possível amenizar sua gravidade através de uma alimentação balanceada com suporte nutricional adequado, evitando medicações que causem diminuição ou excesso de salivação, substituindo-os ou reduzindo a dose sempre que possível”, explica.

A especialista destaca também que é muito importante o diagnóstico precoce na disfagia orofaríngea para a evitar o uso inadequado ou prolongado de sondas nasoenterais, assim como as complicações dessas medidas ou da disfagia, propriamente dita, como pneumonias aspirativas, fibrose pulmonar, desnutrição e desidratação.

E paciente com suspeita de disfagia ou do grupo de risco deve fazer uma a avaliação com o otorrino para realização da endoscopia de deglutição, que é muito importante para o diagnóstico e, assim, evitar uma evolução desfavorável e outras complicações. Vale ressaltar que alguns pacientes apresentam aspiração sem engasgos, o que exige uma avaliação complementar, que também é de extrema importância”, orienta a especialista.

 

Os grupos de risco são:

Portadores de doenças neurológicas, como mal de Parkinson, esclerose lateral Amiotrófica (ELA), paralisia suprabulbar progressiva, acidente vasculoencefálico, neoplasias de cabeça e pescoço

Pacientes que passaram por cirurgias ou radioterapia nessa topografia

Pacientes que passaram por cirurgias de coluna, cirurgias cardíacas ou neurocirugias

 

Tratamento

O tratamento consiste em uma abordagem multiprofissional e interdisciplinar, que envolve medidas em várias etapas: avaliação com otorrinolaringologista para realização da endoscopia de deglutição; avaliação fonoaudiológica e nutricional para complementar e auxiliar na conduta terapêutica; reabilitação fonoaudiolólogica quando a disfagia é apenas com alimentos, e prescrição de medicações xerostômicas quando existe hipersalivação ou aspiração de saliva; na falha terapêutica, é aplicado toxina botulínica nas glândulas salivares; e, em casos mais graves e resistentes ao tratamento clinico, é indicado a abordagem cirúrgica.

 

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