Imunoterapia x câncer de mama - uma nova era e muitos desafios

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), o câncer de mama é o que mais acomete as mulheres em todo o mundo, com 1,38 milhões de novos casos, e 458 mil mortes pela doença por ano. No Brasil, dados da Sociedade Brasileira de Mastologia apontam que uma a cada 12 mulheres serão diagnosticadas com câncer de mama se viverem até os 90 anos de idade.

Longas décadas de pesquisa levaram a imensos avanços no diagnóstico e tratamento do câncer de mama, permitindo a identificação de casos em estágios precoce, com maior chance de cura, além do surgimento de tratamentos menos mórbidos e mais eficazes. No entanto, segundo os especialistas, ainda não foi possível evitar um número considerável de recidivas e mortes relacionadas a esse tipo de câncer.

Para o oncologista Jorge Leal, diretor executivo do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento do Grupo CAM, e Ex-Post Doctoral Fellow no Cedars-Sinai Medical Center, em Los Angeles, nos EUA, o ideal seria um tratamento que gerasse uma “memória” contra a célula maligna tratada no passado, capaz de eliminá-la caso voltasse a aparecer. Para ele, esse é o grande desafio por trás da imunoterapia no tratamento do câncer de mama.

“O nosso sistema imunológico funciona como um exército sentinela de células imunológicas, a exemplo dos linfócitos T, prontas para atacar quando agentes externos ao nosso organismo são detectados, como germes ou células tumorais. Como esse exército é muito potente, lançamos mão de mecanismos de controle capazes de modular o sistema imunológico para que ele não cause danos à nossas células sadias. Um desses mecanismos são os checkpoints imunológicos. Eles funcionam como verdadeiros freios ao ataque imunológico imediato. O uso de inibidores desse sistema potencializa o sistema imune”, revela o oncologista.

Hoje existem alguns desses anticorpos disponíveis para o tratamento de diversos tumores, como melanoma, câncer de pulmão, cólon, cabeça e pescoço, entre outros, com resultados bastante animadores. No câncer de mama, estudos clínicos avaliaram a segurança e a eficácia do tratamento com inibidores, com taxas de resposta variando entre 0 a 24%, a depender dos subtipos biológicos e da linha de tratamento paliativo.

“O que mais chama a atenção nesses resultados é a durabilidade das respostas quando elas ocorrem, como é o caso dos pacientes com câncer de mama metastático triplo negativo (TNBC), com duração de até três anos. É um achado particularmente impressionante, dado a agressividade deste subtipo molecular”, esclarece o especialista.

Segundo ele, a expectativa é que estratégias que levem ao aumento na taxa de resposta à terapia imunológica específica se traduza em maiores taxas de cura para os pacientes, independente do subtipo molecular do câncer de mama.

Entre as estratégias, as mais estudadas são as associações com a quimioterapia, a radioterapia e outras terapias locais, como a crioterapia, técnica local que congela rapidamente o tumor, gerando um dano celular a frio, liberando antígenos tumorais intactos na circulação do paciente.

Um importante estudo clínico levou à aprovação em alguns países da terapia combinando quimioterapia e um anticorpo anti-PD-L1, com aumento da sobrevida das pacientes. Diversos outros estudos clínicos estão em andamento analisando a mesma estratégia com outras classes de imunoterápicos.

Em virtude desses resultados, pesquisadores focados em imunoterapia e câncer de mama desenvolveram estudos associando os anti-PD1 com quimioterapia antes da cirurgia. Os estudos iniciais revelaram que esta estratégia aumentava a chance do tumor desaparecer de forma completa no ato cirúrgico e cerca de 80% dos casos foram atingidos “Número impressionante, e nada visto anteriormente com quimioterapia apenas”, revela o oncologista.

Em relação à radioterapia e à crioterapia, Dr. Jorge, em conjunto com o grupo de pesquisadores do Cedars-Sinai Medical Center, desenvolveu dois estudos que estão avaliando o papel destes tratamentos combinados com imunoterapia no tratamento antes da cirurgia em pacientes com câncer de mama triplo negativo. As pesquisas demonstraram que essa forma de tratamento é capaz de gerar respostas em lesões metastáticas fora da mama. Com isso, as pacientes receberão um protocolo reduzido de quimioterapia e imunoterapia, após a radioterapia.

O especialista explca que o objetivo é analisar a taxa de resposta patológica completa com menos quimioterapia, lançando mão de uma terapia local e imunoterapia. Em breve estes estudos estarão disponíveis no Brasil.

“As estratégias de imunoterapia no câncer de mama evoluíram rapidamente nos últimos anos, de monoterapia a combinações diversas, com impacto significativo na redução de mortalidade por câncer de mama. Espera-se que as combinações racionais de quimioterapia, outras terapias sistêmicas e locais possam conferir benefícios adicionais, de tal forma que a quimioterapia seja reduzida e as taxas de cura aumentem”, conclui o oncologista.